terça-feira, 11 de março de 2008

Viver em descoberta


Por Fátima Oliveira

Os anos 70 foram o inicio das minhas descobertas, dos amores platônicos pelos meus artistas preferidos e amores nem tão impossíveis por alguns dos meus professores. Ouvir o som a todo o volume era como se quisesse assim gritar aos meus pais que eu queria ser ouvida e uma maneira também de afrontar-los, descobri o quanto isso os incomodava e gostava disso.

Depois fui amadurecendo, conheci o grande amor e também, a desilusão de um final nada feliz, mas as coisas para mim, eram encaradas como algo normal, não deu, não deu e a fila já andava, e como! Gostava de passar essa imagem de alto suficiente e minhas amigas me achavam diferente, forte e queriam saber como eu fazia para logo já estar vivendo outro lindo e grande amor, porque eu nunca ficava sozinha, o certo era que eu gostava de despertar e sentir paixão e as coisas aconteciam.

Acho que poderia ter aproveitado mais os estudos, mas era tanta coisa pra viver e a minha escolha principal era viver mais essa fase da maneira mais intensa possível, mas os livros, os romances esses sim eu os consumia e me embalava, ao ponto de as vezes me colocar dento deles.

Quando percebi, já estava casada, e me achando muito realizada, eu queria muito casar e ser mais livre, fazer o que bem entendesse, foi então que fiz uma grande descoberta: Eu não era essa pessoa livre que imaginava, mas em seguida, descobri a maternidade e fiquei encantada... deslumbrada...anos e anos vendo-os crescendo e acompanhando tudo intensamente.
Só depois, bem depois, vi que eu não tinha profissão, pouca liberdade e uma certa frustração, mas resolvi correr atrás, motivada por querer sempre estar vivendo feliz cada fase, conquistei meu trabalho e com ele a satisfação, o reconhecimento, também as dificuldades que o mercado impõe, os recuos que tive que fazer, mas o que mais me marcou nessa minha trajetória simples de vida foi o fato de depois de tantos anos, com filhos já adolescentes, que enfim pude descobrir e me sentir de verdade livre, livre para dizer sim ou não, para ser eu mesma e me sinto muito a vontade para ser essa mulher.

terça-feira, 4 de março de 2008

A descoberta do sertão


O sertão está em toda parte
Guimarães Rosa


Barro Vermelho é um lugarejo com uma dúzia de casas espalhadas pelas margens do asfalto novo, onde carros e caminhões passam indiferentes aos sorrisos e gentilezas de Dona Luzia, matriarca da família que me acolheu durante as oficinas de rádio-escola de Crateús.

A única escola do lugar era também a morada de muitos pássaros que teimavam em participar das oficinas, cantando mais alto do que qualquer um conseguia falar, mas de grande valia para mostrar um belo exemplo de efeito sonoro. Da porta da escola podíamos ver um horizonte sem fim, uma serra que depois descobri ser chamada “das Almas” e um verde que aparece vibrante com a primeira gota de chuva.

Mas, para conhecer a beleza secreta de Barro Vermelho é preciso esperar a chegada da noite. Sem a concorrência dos postes ou mesmo da lua que naqueles dias era nova, as milhares de estrelas, imagem inédita para a menina da cidade que sou, tomaram conta do céu. Num passeio pela beirada do asfalto podíamos ver as estrelas pelo reflexo do açude, deixando uma sensação de que o céu estava ao alcance das mãos. Demorei pra perceber, mas os pingos de luz que piscavam perto de mim eram vaga-lumes, completando o cenário de magia e revelando que o segredo do sertão é dar o devido destaque ao que realmente é belo.